segunda-feira, 21 de julho de 2014

HEMOGRAMA

domingo, 20 de julho de 2014

A noite que nunca acaba...

A noite que nunca acaba 

A Lua brilha no céu da noite que nunca acaba. Dentro do carro não se faz sentir o frio do inverno com a mesma força e fecho os olhos. Ao meu lado, ela estala os dedos três vezes e volto aos dezesseis. Estou em frente à escrivaninha de meu quarto, papel em branco, caneta à mão e uma vida inteira a ser traçada. Os versos são paridos com a fúria da juventude e a incerteza de quem acabara de descobrir o amor nos braços da primeira namorada. Amor, palavra estranha: difícil de falar, tão fácil de rimar. E tudo terminou em "ar". Não sei se Guta, mulher aos dezessete, gostou realmente do que leu ou se protagonizou o primeiro orgasmo fingido da minha poesia de menino. Apenas restou daquele momento a sensação que viria a me acompanhar pelo resto dos dias: a de estar nu, completamente exposto à quem faz de mim poeta e descobre isso em poucas linhas e um ponto final. No banco do passageiro, ela estala novamente os dedos: um-dois-três e tenho oito anos. Corro pelo bosque sorrindo sem motivo aparente. Brinco de um lado ao outro, finjo que vou e não vou, choro e faço chorar. Aos poucos os mistérios do mundo saem do esconderijo da compreensão limitada e vivo a liberdade plena do descobrimento. Não forjo expectativas na ilusão, tampouco sinto medo. A vida é doce feito um sonho bom. Avança a madrugada e o processo se repete: vejo-me no útero de minha mãe. Estou protegido dentro da bolsa quente e inundada. Alimento-me do que se alimenta; respiro o que respira; amo o que ama; não me sinto só. Ouço os sons lá fora como algo distante. As buzinas, as pessoas, a vida, a morte, nada, absolutamente nada faz sentido. Nem precisa fazer. O útero basta. No carro estacionado, curiosa, mas sensata, ela entende que já é o suficiente e me chama: “quando eu contar até cinco, você vai voltar”. Um, dois, três, quatro, cinco. Eu não volto. “Não brinca comigo”, ela ordena, “quando eu contar até dez, você deve voltar”. Seis, sete, oito, nove, dez. Eu não volto. No rádio, baixinho, alguma canção de Vinicius. Resignada, encosta a cabeça em meu ombro e se ajeita pra dormir. Ela me conhece por inteiro, afinal. E a noite nunca acaba.

A Patisserie

domingo, 11 de maio de 2014

Entre o que foi e o que será

Ela vem
Entre o que foi e o que será
Ela vem
E diz que não quer mais amar
Ela vem
Como quem 
Não quer chegar
Quando a dor
Machucou seu coração
Quando a dor
Pagou o bem com ingratidão
Quando a dor
Se instalou
Pareceu tudo em vão
Mas seu olhar
Diz o que ela não me diz
O seu olhar
Revela o que ela sempre quis
Seu olhar
Devagar
Me fala de amor 
E a poesia
Que nela mora se liberta
A poesia
É reescrita em linhas certas
Poesia
Flor aberta

Que desabrochou

Rosas, Sonhos, Blues

Não tenho medo de dizer
Que eu tenho medo de dizer
Que eu te amo
E quando a noite vem
Eu que não tenho mais ninguém
Não tenho medo de aceitar
Que eu te amo

Mas o amor que está tão certo
Não está nem perto
De acontecer
Nada me importa, eu não ligo
Inconscientemente brigo
Por você

Rosas, sonhos, blues
Eu vou andando contra a luz
Lá vem a moça de capuz
Quebrando regras e tabus

Somente sei 
O que aconteceu  
O que virá
Pertence a Deus

Somente sei
O que aconteceu
E aconteceu

Os olhos teus 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Blues das Flores


Hoje passei na sua casa
Como você me pediu
Para regar as flores
Que deixou quando partiu
Tudo estava tão calmo
Tudo no seu lugar
A Bíblia aberta nos salmos
e os santos no altar
Na cabeceira da cama
Nosso retrato sorria
Por sobre a estante do quarto
O livro de poesia
Então abri a janela
Deixei o vento entrar
Olhando pra passarela
Que dá pro lado de lá

Quando você vem por ela, pensei
Quando você vem, meu bem?
As flores que hoje reguei
não vão resistir...

Montanhas e rodovias
Se erguem diante de nós
Mas a saudade é tão grande
Que nunca nos deixa a sós
Ontem você me falou
Que à noite sonhou comigo
Não foi um sonho tão bom
Porque a gente corria perigo
Mas não tema por nada
Estou aqui pra nos proteger
As flores foram regadas
E eu espero você
Pra dizer que te amo
Quantas vezes for preciso dizer
Neste blues eu te chamo
Vamos viver, vamos viver

Quando você vem por ela, pensei,
Falta tão pouco, meu bem
As flores que hoje reguei

voltarão a se abrir...

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Saudade boa


Saudade boa
É pra vida inteira
Sempre companheira
Do meu versejar
Meu avô dizia
A saudade passa
Mas não passa o amor
E o amor, saudade dá

E o amor, saudade dá (2x)

Quem tem saudade chora
Quem não tem chora também
Mas saudade vira samba
E quem samba vive bem
Quem não samba fica triste
Chora por qualquer razão
Eu prefiro só chorar
Por quem tem meu coração

Saudade boa...

O pandeiro cai no samba
Com saudade da viola
E o gol só acontece
Porque à rede falta a bola
Meu amor não se preocupe
Que malandro tem escola
Passarinho fugido volta
Com saudade da gaiola

Saudade boa...